Sêneca, Carta 5: Sobre a virtude do Filósofo
- Método & Valor
- 25 de ago. de 2024
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Saudações de Sêneca a Lucílio.
Agradeço seu elogio e orientação. Concordo plenamente com a ideia de que a verdadeira filosofia deve ser buscada internamente e não expressa apenas através de gestos externos ou modismos. A busca pelo aprimoramento pessoal deve ser um esforço sincero e discreto, e não um espetáculo para impressionar os outros.
Concordo que trajes extravagantes, desleixados ou quaisquer formas de autoexibição não devem ser um reflexo da verdadeira filosofia. A aparência externa deve ser adequada ao contexto social e não deve servir como uma forma de chamar atenção ou se destacar de maneira artificial. Manter um padrão de vida que esteja alinhado com os valores de simplicidade e moderação, sem desviar para extremos, é essencial. A ideia é ser um exemplo positivo sem causar desconforto ou repelir aqueles que podem se beneficiar da filosofia.
Assim, continuarei a me esforçar para manter essa consistência entre o que sou internamente e como me apresento externamente, buscando sempre a verdadeira melhoria pessoal e a integridade.
A filosofia deve promover uma convivência harmoniosa e simpática entre os homens, e não se deve confundir essa simplicidade com a busca por uma aparência que pareça forçada ou desprovida de senso estético. Assim como não faz sentido buscar luxos e iguarias desnecessárias, também não é sensato rejeitar o que é habitual e acessível apenas por uma falsa impressão de austeridade.
A verdadeira simplicidade filosófica não é uma penitência, mas uma escolha consciente por uma vida que valoriza o essencial e o útil. Devemos ser capazes de manter a elegância e a assepsia sem cair na ostentação, e a nossa vida deve refletir a combinação de sabedoria e prática comum.
Os outros devem perceber nossa diferença de forma sutil e natural. Se somos verdadeiramente sábios, isso se manifestará não através de ostentação, mas na maneira como utilizamos os recursos disponíveis com equilíbrio e discrição. Usar pratos de barro como se fossem de prata demonstra uma atitude de moderação, mas usar prataria com simplicidade também reflete um discernimento verdadeiro.
A filosofia não deve se manifestar em excessos ou contradições, mas sim em uma forma de viver que é admirada e compreendida pelos outros. Portanto, nossa vida filosófica deve ser um exemplo de como a simplicidade e a dignidade podem coexistir sem necessidade de excentricidades ou ostentação.
Gostaria de compartilhar também a reflexão positiva de hoje. Nos escritos de nosso Hecato, descobri que limitar os desejos também pode ajudar a mitigar os medos: “Abandone a esperança”, diz ele, “e você deixará de temer”. Talvez você questione como algo tão distinto pode coexistir. Porém, meu caro Lucílio, embora pareçam diferentes, estão intrinsecamente conectados. Assim como a mesma corrente limita tanto o prisioneiro quanto o carcereiro, a esperança e o medo, por mais distintos que sejam, caminham lado a lado; o medo acompanha a esperança.
Não é surpreendente que isso aconteça dessa forma; ambos os conceitos residem em uma mente insegura, que se preocupa com o futuro. O principal problema é que não nos ajustamos ao presente, mas enviamos nossos pensamentos para um futuro distante. Assim, a previdência, que deveria ser uma das maiores dádivas da humanidade, acaba se tornando distorcida.
Os animais evitam os perigos que enxergam e, uma vez que escapam, ficam livres de preocupações; mas nós, humanos, nos angustiamos tanto com o que está por vir quanto com o que já passou. Muitas vezes, nossas próprias bênçãos acabam se tornando fontes de sofrimento; a memória revive as torturas do medo, enquanto a expectativa antecipa novas ansiedades. O presente, por si só, não faz nenhum homem infeliz.
Mantenha-se Forte. Mantenha-se Bem.
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